Tese
O eventual pagamento de benefício previdenciário na via administrativa, seja ele total ou parcial, após a citação válida, não tem o condão de alterar a base de cálculo para os honorários advocatícios fixados na ação de conhecimento, que será composta pela totalidade dos valores devidos.
Hipótese fática
O INSS apresentou, na fase de cumprimento de sentença, os cálculos dos valores dos benefícios e dos honorários advocatícios (que cabiam ao advogado do exequente) objeto da execução.
O juiz de primeiro grau, entretanto, decidiu que o INSS retirou de modo indevido, da base de cálculo dos honorários, os valores que foram pagos administrativamente – depois de ajuizada a ação. O INSS entrou com agravo de instrumento, julgado pelo TRF4, que confirmou a decisão de primeiro grau.
O INSS, então, interpôs recurso especial, para defender a tese de que a base de cálculo dos honorários advocatícios deve ficar restrita ao valor que vai ser executado, descontadas as parcelas pagas administrativamente, porque, relativamente a essas, não houve pretensão resistida. O recurso, submetido ao rito dos repetitivos, foi julgado pela Primeira Seção da Corte
Fundamentos
O STJ fixou a premissa inicial a respeito do caso; a Corte citou o art. 85, § 2º, do CPC, segundo o qual “Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa.”
A base de cálculo dos honorários advocatícios trabalha, portanto, com o “proveito econômico obtido”, expressão que não se confunde com o valor a ser executado.
De fato, tendo o INSS realizado o indeferimento administrativo do benefício, a ação ajuizada serve para discutir todas as parcelas tidas por devidas. O eventual pagamento administrativo do benefício ou de parte dele, realizado depois da citação, não afasta a conclusão de que essas parcelas eram controvertidas na origem e integram, por isso mesmo, a base dos honorários advocatícios.
O STJ considerou que é legítimo descontar os valores pagos apenas do montante que vai ser executado em favor do segurado (até porque parte dessa dívida já foi paga), mas a base de cálculo dos honorários advocatícios permanece ampla, contando inclusive com as parcelas pagas administrativamente (pagas depois da citação no processo judicial).
Se não fosse assim, poderia ocorrer a situação peculiar em que o INSS, ao reconhecer o débito integral em via administrativa, posteriormente à propositura da ação de conhecimento em face do indeferimento do benefício previdenciário pela Administração Pública, ficaria desincumbido do valor devido a título de honorários advocatícios ao patrono que atuou na causa judicial previdenciária.
Dispositivos
Código de Processo Civil
Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.
(...)
§ 2º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos:
I - o grau de zelo do profissional;
II - o lugar de prestação do serviço;
III - a natureza e a importância da causa;
IV - o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.
Ementa
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO DO ART. 1.022 DO CPC/2015. INOCORRÊNCIA. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. BASE DE CÁLCULO. DESCONTO DOS VALORES DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO RECEBIDO ADMINISTRATIVAMENTE. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO ESPECIAL JULGADO SOB O RITO DOS RECURSOS REPETITIVOS (ART. 1.036 DO CPC/2015). RECURSO ESPECIAL DA AUTARQUIA FEDERAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. No recurso especial da autarquia federal discute-se a possibilidade de desconto da base de cálculos dos honorários advocatícios dos valores recebidos administrativamente pela parte autora.
2. Não houve violação do art. 1.022 do CPC/2015, pois a prestação jurisdicional foi dada na medida da pretensão deduzida, conforme se depreende da análise do acórdão recorrido. O Tribunal de origem apreciou fundamentadamente a controvérsia, não padecendo o acórdão recorrido de qualquer omissão, contradição ou obscuridade.
3. A prescrição do art. 85, §2º, do CPC/2015 sobre os critérios para o arbitramento dos honorários de sucumbência prevê o conceito de proveito econômico. Com efeito, o proveito econômico ou valor da condenação da causa não é sinônimo de valor executado a ser recebido em requisição de pagamento, mas sim equivale ao proveito jurídico, materializado no valor total do benefício que foi concedido ao segurado por força de decisão judicial conseguido por meio da atividade laboral exercida pelo advogado.
4. O valor da condenação não se limita ao pagamento que será feito do montante considerado controvertido ou mesmo pendente de pagamento por meio de requisição de pagamento, ao contrário, abarca a totalidade do proveito econômico a ser auferido pela parte beneficiária em decorrência da ação judicial.
5. Consoante entendimento firmado por este Superior Tribunal de Justiça, os valores pagos administrativamente devem ser compensados na fase de liquidação do julgado; entretanto, tal compensação não deve interferir na base de cálculo dos honorários sucumbenciais, que deverá ser composta pela totalidade dos valores devidos (REsp.
956.263/SP, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, QUINTA TURMA, DJ 3.9.2007, p. 219).
6. Os honorários advocatícios, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC/2015, são fixados na fase de conhecimento com base no princípio da sucumbência, ou seja, em razão da derrota da parte vencida. No caso concreto, conforme constatado nos autos, a pretensão resistida se iniciou na esfera administrativa com o indeferimento do pedido de concessão do benefício previdenciário.
7. A resistência à pretensão da parte recorrida, por parte do INSS, ensejou a propositura da ação, o que impõe a fixação dos honorários sucumbenciais, a fim de que a parte que deu causa à demanda assuma as despesas inerentes ao processo, em atenção ao princípio da causalidade, inclusive no que se refere à remuneração do advogado que patrocinou a causa em favor da parte vencedora.
8. Tese fixada pela Primeira Seção do STJ, com observância do rito do julgamento dos recursos repetitivos previsto no art. 1.036 e seguintes do CPC/2015: o eventual pagamento de benefício previdenciário na via administrativa, seja ele total ou parcial, após a citação válida, não tem o condão de alterar a base de cálculo para os honorários advocatícios fixados na ação de conhecimento, que será composta pela totalidade dos valores devidos.
9. Recurso especial da autarquia federal a que se nega provimento.
(REsp n. 1.847.731/RS, rel. Min. , Primeira Seção, julgado em 28/4/2021, DJe de 5/5/2021.)