Tese
Tema 1217. É válido o ato jurídico de cancelamento automático de precatórios ou requisições federais de pequeno valor realizados entre 06/07/2017 (data da publicação da Lei 13.463/2017) e 06/07/2022 (data da publicação da ata da sessão de julgamento da ADI 5.755/DF), nos termos do art. 2º, caput, e § 1º, da Lei 13.463/2017, desde que caracterizada a inércia do credor em proceder ao levantamento do depósito pelo prazo legalmente estabelecido (dois anos). É ilegal esse mesmo ato se circunstâncias alheias à vontade do credor impediam, ao tempo do cancelamento, o levantamento do valor depositado.
Hipótese fática
O STJ julgou recurso especial, submetido ao regime dos recursos repetitivos, para definir se as instrituições financeiras podem promover o cancelamento automático dos precatórios e requisições de pequebo valor (RPVs) federais não sacados no prazo de dois anos, com a devolução dos recursos aos cofres do Tesouro Nacional.
A controvérsia surgiu tendo em vista a decisão do STF proferida na ADI 5.755, que declarou a inconstitucionalidade da Lei 13.463/2017, na parte que autorizava esses cancelamentos automáticos. Os efeitos da decisão de inconstitucionalidade, entretanto, começaram a operar em 06/7/2022, de modo que o STJ precisou avaliar a legalidade dos cancelamentos de precatórios realizados entre 06/07/2017 e o momento a partir do qual a inconstitucionalidade passou a valer.
Fundamentos
A controvérsia teve início com a edição da Lei 13.463/2017, que previu a possibilidade de as instituições financeiras cancelarem, de modo automático, os precatórios e as requisições de pequeno valor expedidos no âmbito federal, mas não sacados dentro do prazo de dois anos.
A regra foi impugnada no STF, que julgou a ADI 5.755 para declarar o dispositivo inconstitucional.
O Supremo entendeu que esse cancelamento automático de precatórios e requisições de pequeno valor ofende o devido processo legal, o contraditório, a proporcionalidade e a segurança jurídica, na medida em que, sem a comunicação do ato ao credor, promove a devolução do montante aos cofres do Tesouro Nacional. A conclusão foi firmada mesmo diante da possibilidade de o credor requerer a expedição um novo precatório/requisição de pequeno valor.
O STF, porém, promoveu a modulação dos efeitos da decisão (ao julgar os embargos de declaração que foram interpostos), para afirmar que essa inconstitucionalidade apenas valeria a partir de 06/07/2022, data do julgamento do mérito da ADI.
O problema, então, se voltou aos cancelamentos de precatórios e RPVs feitos entre 06/07/2017 (data da vigência da Lei 13.463/2017, que passou a autorizar esses cancelamentos) e 06/07/2022 (momento a partir do qual a inconstitucionalidade passaria a valer).
Esse problema remanescente foi resolvido pelo STJ, em recurso repetitivo que gerou a tese do Tema 1.217 e que fez o chamado controle de legalidade.
O STJ entendeu que os cancelamentos dos precatórios e RPVs realizados nesse período são válidos, desde que atendam a dois requisitos: a) inércia do credor em realizar o levantamento dos valores e b) ultrapassagem do prazo de dois anos.
Esse primeiro requisito, aliás, torna a análise dos casos bem objetiva. Não se pode falar em inércia do credor se havia algum motivo legítimo - como a existência de uma decisão judicial - a impedir o saque dos valores. Nesse caso, o eventual cancelamento do precatório/RPV se revela inválido.
O detalhe é que a instituição financeira não dispõe da informação processual. A rigor, o banco não sabe da existência do motivo que justifica a ausência do saque, o que levou o STJ a concluir que o credor deveria se manifestar no processo, mencionando para o juízo a existência do acontecimento:
“Nos casos em que inexiste inércia do credor, mas razões outras impedem o levantamento do depósito, é de rigor que seja comunicada a instituição financeira depositária, tal como previsto no art. 33, § 2º, da Resolução 303/2019 do Conselho Nacional de Justiça, que regulamentava o cancelamento automático previsto na Lei 13.463/2017. Para que tal comunicação se consume, constitui ônus do interessado provocar o juízo da execução, a fim de que se oficie à instituição depositária de modo a se impedir o cancelamento automático do RPV ou precatório, ou, se já automaticamente cancelado, para que se proceda ao estorno dos valores indevidamente transferidos à Conta Única do Tesouro Nacional.”
De resto, na hipótese de o cancelamento ter sido feito de forma válida, a expedição de um novo precatório/RPV se submete ao prazo prescricional, conforme o STJ já havia fixado na tese do Tema 1.141 dos recursos repetitivos, de acordo com o qual “A pretensão de expedição de novo precatório ou requisição de pequeno valor, fundada nos arts. 2º e 3º da Lei 13.463/2017, sujeita-se à prescrição quinquenal prevista no art. 1º do Decreto 20.910/32 e tem, como termo inicial, a notificação do credor, na forma do § 4º do art. 2º da referida Lei 13.463/2017.”
Dispositivos
Lei 13.463/2017
Art. 2º Ficam cancelados os precatórios e as RPV federais expedidos e cujos valores não tenham sido levantados pelo credor e estejam depositados há mais de dois anos em instituição financeira oficial.