Tese
A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento administrativo", conforme decidiu o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 631.240/MG, sob o rito do artigo 543-B do CPC, observadas "as situações de ressalva e fórmula de transição a ser aplicada nas ações já ajuizadas até a conclusão do aludido julgamento (03/9/2014)”.
Hipótese fática
O Tribunal Regional Federal da 3ª Região, negou provimento a um agravo de instrumento, adotando a conclusão de que os benefícios previdenciários não precisam ser submetidos ao prévio requerimento administrativo – de modo que o segurado poderia entrar diretamente com a ação judicial.
O INSS, porém, interpôs recurso especial contra esse acórdão do TRF3, para sustentar que o entendimento recorrido contrariava a regra do art. 267, VI, do CPC/73 (correspondente ao art. 485, VI, do CPC/2015), que exige a presença do chamado interesse processual, o qual apenas vai existir depois de feito o prévio requerimento administrativo.
Fundamentos
A questão definida pelo STJ dizia respeito à necessidade de o segurado realizar o prévio requerimento administrativo do benefício previdenciário ou se ele poderia ingressar diretamente com uma ação no Poder Judiciário.
A Corte começou por lembrar os entendimentos mais antigos sobre o assunto, de que é exemplo a Súmula 213 do antigo Tribunal Federal de Recursos, segundo a qual “O exaurimento da via administrativa não é condição para a propositura de ação de natureza previdenciária.”
Nessa mesma linha dispunha a Súmula 89 do STJ, embora com um alcance mais restrito: "A ação acidentária prescinde do exaurimento da via administrativa."
Mas o quadro mudou de figura a contar do julgamento, pelo STF, do Recurso Extraordinário 631.214, quando o Supremo entendeu que “a concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise.”
O STJ, então, reproduziu nesse REsp 1.369.834 os mesmos fundamentos expostos pelo STF no RE 631.214.
Em síntese, a Corte aplicou o chamado interesse processual, instituto que se divide em interesse-necessidade (o ajuizamento de uma ação judicial pressupõe que a parte não possa obter o que pretende por uma outra via), interesse-utilidade (a ação ajuizada deve ter a aptidão para produzir algo útil) e interesse-adequação (a parte deve postular em juízo valendo-se de um meio adequado).
De modo mais específico, o que o STJ aplicou foi o interesse-necessidade: não há necessidade de ir a juízo, se o pedido de concessão do benefício previdenciário sequer foi feito no INSS.
Sem esse prévio requerimento, não há resistência. A lide não se forma. A rigor, se a parte pode obter o benefício no próprio INSS, não há necessidade de requerê-lo no Poder Judiciário. Aliás, embora ao acesso à justiça seja livre, ele depende da satisfação de alguns requisitos, sem os quais o processo não pode tramitar.
A Corte deixou claro, entretanto, que não há a necessidade de se obter o exaurimento do processo administrativo. Vale dizer: não há necessidade de se interpor recurso administrativo da decisão de indeferimento (a parte é livre para fazê-lo), assim como não há necessidade de se aguardar de modo indefinido pela decisão de primeiro grau administrativo – sob pena, aí sim, de se contrariar a cláusula do acesso à justiça.
Também é preciso pontuar que esse entendimento do STJ e do STF ressalva as ações em que a parte pede a revisão do benefício previdenciário; de fato, nesse caso da revisão dos benefícios, o INSS tem o dever de agir de ofício, ajustando o valor da prestação paga. Por isso, se o ente não agiu, cumprindo o que lhe era de dever, já fica caracterizado o interesse processual (interesse-necessidade).
Dispositivos
Constituição Federal
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;
(...)
Código de Processo Civil de 1973
Art. 267. Extingue-se o processo, sem resolução de mérito: (Redação dada pela Lei nº 11.232, de 2005)
(...)
Vl - quando não concorrer qualquer das condições da ação, como a possibilidade jurídica, a legitimidade das partes e o interesse processual;
(...)
Código de Processo Civil de 2015
Art. 485. O juiz não resolverá o mérito quando:
(...)
VI - verificar ausência de legitimidade ou de interesse processual;
(...)
Ementa
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. NECESSIDADE. CONFIRMAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE SUPERIOR AO QUE DECIDIDO PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NO JULGAMENTO DO RE 631.240/MG, JULGADO SOB A SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL.
1. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 631.240/MG, sob rito do artigo 543-B do CPC, decidiu que a concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento administrativo, evidenciando situações de ressalva e fórmula de transição a ser aplicada nas ações já ajuizadas até a conclusão do aludido julgamento (03/9/2014).
2. Recurso especial do INSS parcialmente provido a fim de que o Juízo de origem aplique as regras de modulação estipuladas no RE 631.240/MG. Julgamento submetido ao rito do artigo 543-C do CPC.
(REsp n. 1.369.834/SP, relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, julgado em 24/9/2014, DJe de 2/12/2014.)